
A aula começou com um passeio por várias sonoridades árabes e o público logo percebeu a diversidade existente. Os sons identificam as tradições de um povo: a escolha de determinados sons, ritmos e instrumentos, é ligada intimamente à sua cultura e da organização social. Sabemos que o mundo árabe é bastante heterogêneo, logo sua música também é um mosaico. Apesar dessa diversidade, algumas características são comuns a quase todas as músicas produzidas pelos árabes.
A primeira, comentada pelos ouvintes, foi que as músicas lembravam canções de roda, cantigas de ninar. Isso acontece por seu caráter circular: as frases musicais se repetem, girando em torno de algumas notas. A repetição envolve as pessoas, gerando outro padrão interno. Então, quem está dentro se envolve, como uma criança num balanço...
Não passou despercebida também a importância da palavra. Toda a música árabe é baseada na palavra e na forma de pronunciá-la. A linha melódica imita a voz humana: não existem grandes saltos na altura das notas, as frases são ditas com as mesmas inflexões e ritmos das palavras. Versos e melodias estão totalmente associados.
Se a palavra é tão importante, é natural que todos os que estejam executando a música “digam a mesma palavra”, ou seja, que toquem as mesmas notas. Todos os instrumentos executam a mesma linha melódica, os músicos estão intimamente ligados à palavra ou à melodia que querem expressar juntos. Logo alguém da platéia lembrou daqueles maravilhosos improvisos, sejam vocais ou instrumentais, e perguntou como isso poderia acontecer se todos têm que fazer a mesma coisa. Acontece que na música árabe existe o momento da união, mas também o momento da liberdade: podem ocorrer improvisos entre duas frases ou mesmo no meio delas. Esse jogo enriquece a música.
Outra pergunta dos ouvintes: por que a música árabe soa tão diferente da música ocidental? A principal razão é que a música oriental possui mais notas que a ocidental. Existem notas além das que nos acostumamos a ouvir; notas intermediárias. A princípio, nossos ouvidos estranham, mas logo se acostumam com estas sonoridades, que possibilitam maior complexidade e riqueza. Uma pessoa da platéia lembrou do pai de olhos fechados, se deleitando com músicas maravilhosamente bem trabalhadas. Isso ocorre porque a música árabe pode gerar estados emocionais e espirituais, por causa da forma de utilização dos sons: a chamada musicoterapia já era conhecida entre os árabes e muitos outros povos da antiguidade! Esta música acontece sobre um ambiente sonoro, ou seja, trabalha em torno de uma seqüência de notas (chamadas modos ou ajnas) que produz efeitos sobre o ser humano. A combinação destes modos, que gera uma “escala” (maqam), tem nomes que dão uma noção de seu uso: o amigo, o outono, a brisa, o que abre o coração, a alegria, a gazela, a que parece com a lua, etc. Na verdade, a maqam tem características que vão muito além da seqüência de notas, mas isto é um assunto para outro texto...
Outra característica importante que gera este “maravilhamento” é que a música árabe ainda utiliza a chamada afinação natural, baseada na vibração das cordas dos instrumentos. Os sons produzidos por essas vibrações emitem freqüências que se harmonizam com as do ser humano, produzindo um grande bem-estar. Sentimos-nos “em casa”. Esta afinação foi também utilizada pelos ocidentais até o início do século XVIII, quando surge o sistema temperado. Todas as notas passam a ter o mesmo valor - as mesmas distâncias -, acabando com as nuances da afinação natural, onde os sons eram produzidos pela vibração de uma corda dividida em partes e não a partir de um valor matemático. Essa mudança foi fruto do racionalismo, que rejeitou vários aspectos das artes e ciências existentes. A música ocidental passou também por isso e perdeu muito com estas alterações.
Muitos músicos árabes contemporâneos continuaram produzindo música com sua riqueza e complexidade; mas alguns optaram por trabalhar com instrumentos temperados, o que reduz muito o campo sonoro. Poucas maqamat podem ser tocadas em instrumentos temperados, pois estes possuem menos notas e poucas possibilidades de trabalhar a sutileza existente nas músicas árabes. Existe o risco de estes músicos não saberem mais trabalhar com estas características, o que seria uma perda muito grande.
Felizmente existem muitos músicos árabes de excelente qualidade que estão empenhados em expressar e passar adiante este conhecimento, que exige muita dedicação, estudo e empenho. Mas exige, principalmente, um ouvido atento e um coração aberto, para que estes sons toquem sua alma e assim se possam produzir lindas melodias para o mundo.
tia marcia,
ResponderExcluirnao pude ler todos os posts do blog novo,mas pelo que vi esta otimo e muito lindo. Espero que faca muito sucesso.
beijos
Caio
Caio, querido, obrigada pelo carinho e pela torcida!
ResponderExcluirÉ muito bom fazer o que a gente gosta e ainda por cima trocar idéias com outras pessoas que também se interessam pela mesma coisa!
Um beijo e até já,
Tia Marcia
Mais uma vez, amei esse texto!! Não repara q estou lendo seu blog em doses homeopáticas por pura falta de tempo, então prefiro ir lendo com calma!!rssss
ResponderExcluirElaborei um site sobre meu trabalho com dança e tomei a liberdade de colocar um link do seu blog, quero divulgar essa maravilha, se me permitir é claro!!Ainda preciso fazer uns ajustes mas já está no ar. www.cristinaantoniadis.com
Mil bjsss
Cristina, obrigada pela mensagem e apoio!
ResponderExcluirÉ claro que pode colocar o link, é uma honra para mim. Seu site está muito legal, parabéns! E se precisar de alguma coisa é só falar. Manda um beijo para o Sami, meu amigo e seu marido, um músico talentoso e, coisa rara, generoso!
Beijos,
Marcia
em são paulo tem alguem que de aulas de musicas arabes? para melhorar voz e tal!!
ResponderExcluirbjs
Obrigada pelo contato!
ResponderExcluirEu indico o Sami Bordokan, que tem muito conhecimento teórico e prático, toca um alaúde maravilhoso e uma bela voz!
Devo a ele muito do que aprendi sobre música árabe. Fiz dois anos de aulas particulares com ele a respeito da teoria, ritmos, aplicação na dança, etc.
Visite o site dele:
http://www.samibordokan.com.br ou entre em contato:
sami@samibordokan.com.br
telefones: 11 9399-0114/5041-9428
Beijos,
Marcia
Olá Boa Tarde.
ResponderExcluirMe chamo Vivian e estou com um grande interesse em adquirir o livro Música Arábe: Expressividade e Sutileza, porem estou com muita dificuldade . Faz cerca de um mês que solicitei o livro na livraria cultura e até o momento eles não sabem me posicionar sobre o porque não consigo comprar o livro . Você pode me ajudar com alguma informação.
Beijo Vivian.
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Marcia, como faço para comprar seu livro? Jhade
ResponderExcluirJade
ResponderExcluirVocê pode comprar na BibliASPA ou diretamente comigo, em São Paulo.
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obrigada,
Marcia